Após “susto” em Florianópolis, professor do IFSC orienta o que fazer caso você encontre material radioativo

O que fazer caso você encontre um material radioativo, situação que os especialistas chamam de “emergência radiológica”? Pode parecer algo improvável caso você não trabalhe com isso, mas não é. Há cerca de três semanas, o Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil, além de dois professores do IFSC especialistas na área, foram envolvidos na análise de um material radioativo encontrado em uma casa abandonada em Florianópolis.

O caso ocorreu em 18 de julho, no bairro Ingleses, na região norte da capital catarinense. O Corpo de Bombeiros foi chamado para atender uma ocorrência envolvendo material com o símbolo que indica radioatividade (um trifólio preto sobre fundo amarelo). As defesas civis estadual e municipal também foram acionadas, assim como dois professores do IFSC: Marcelo Girardi Schappo, do Câmpus São José, que possui capacitação em resposta em emergências radiológicas e nucleares; e Daiane Cristini Barbosa de Souza, da área de Radiologia do Câmpus Florianópolis. A Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), órgão do governo federal, foi contatada para ser informada sobre o fato e repassar orientações.

No local foram feitas medições com aparelhos detectores de radiação, e os resultados não apontaram nenhum risco que merecesse atenção ou ações adicionais. O material tratava-se de partes de equipamentos para uso em medicina nuclear, possivelmente deixado ali pelo antigo dono da casa, que faleceu recentemente, e foi encontrado por um familiar dele que foi fazer a limpeza do local. O item foi repassado à CNEN, que deu a destinação adequada ao material.

A pessoa que encontrou o material no bairro Ingleses fez o correto: acionou as autoridades competentes. Um dos professores que participou da ação, Marcelo Schappo diz que a orientação ao encontrar material radioativo – ou que se suspeita ser radioativo – é “não mexer sob hipótese alguma” e contatar órgãos como o Corpo de Bombeiros, a Defesa Civil ou a própria CNEN (veja links para os sites abaixo). O manejo inadequado desses materiais pode causar danos severos à saúde e até a morte, dependendo da quantidade de radiação a que a pessoa foi exposta.

-> Site do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina
-> Site da Defesa Civil de Santa Catarina
-> Site da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN)

 
O professor do Câmpus São José possui capacitação em respostas a emergências radiológicas e nucleares pelo Instituto de Radioproteção e Dosimetria (IRD), vinculado à CNEN, e já ministrou curso para o Corpo de Bombeiros na área. Na entrevista a seguir, ele traz informações sobre o tema.

VEJA A ENTREVISTA:

INFORME FLORIPA: O que fazer caso encontrar material radioativo?
Marcelo Schappo, professor do Câmpus São José do IFSC: Quando a pessoa encontra um material radioativo, a recomendação mais importante é atuar contra a própria curiosidade dela de querer saber, de querer mexer, de querer ver o que tem dentro. Então, o certo é não mexer sob hipótese alguma. Isso envolve não tocar, não manipular, não abrir, não quebrar, não mover para outro lugar, não entregar pra alguém, enfim, nenhum tipo de manipulação, nenhum tipo de abertura. A segunda coisa é manter a distância. Mais distante, mais seguro. E, nesse sentido, não deixar que as pessoas se aproximem também, fazendo algum isolamento no local. Depois, fazer contato com as autoridades responsáveis por gerenciar a ocorrência.

INFORME FLORIPA: Por que não devemos manipular esse material?
Marcelo Schappo: Porque não temos como saber, observando apenas a olhos nus, se aquele material encontrado é mesmo radioativo ou não, e, se for, se está ativo ou não. Nossos sentidos não percebem radioatividade. Então, o certo é recorrer a equipamentos adequados, que devem ser levados ao local, para fazer a verificação da existência ou não de algum risco radiológico. Agora, quem vai fazer isso? Existe a Central de Emergências da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). A CNEN tem uma divisão de atendimento de emergências (Dieme), que fica no Rio de Janeiro, competente para fazer esse gerenciamento. Ela vai dar apoio para qualquer tipo de emergência radiológica e nuclear que acontecer no Brasil. E dentro dos estados e dentro das cidades, quem pode fazer essa ponte com a DIEME são os órgãos competentes daquela região, como o Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil. Além disso, profissionais da Física que tenham conhecimento e capacitação sobre o assunto, como o nosso Instituto Federal aqui tem, especialmente no IFSC São José e no IFSC de Florianópolis (câmpus do Centro), podem prestar apoio e orientações.

INFORME FLORIPA: Como podemos identificar um material radioativo?
Marcelo Schappo: Identificar materiais radioativos não é nada simples, principalmente se ele não tiver adequadamente identificado com o símbolo internacional do risco radiológico, o chamado “trifólio”, que muita gente já viu ao entrar em uma sala de exames por raios-X. Um grande problema na identificação dos objetos que podem conter materiais radioativos é que as aplicações da radioatividade são muito diversas, passando pela medicina nuclear, pela indústria e também por aplicações científicas em laboratórios de pesquisa. Então, os objetos que contêm fontes podem ter aparências, como formatos, tamanhos e estados físicos, bem diferentes. Não é possível identificar apenas olhando, se não houver a identificação internacional. Portanto, a maior recomendação nesse sentido é atentar para a presença do símbolo, que é obrigatória nesses objetos.

INFORME FLORIPA: E quais são os riscos que a manipulação inadequada de material radioativo traz?
Marcelo Schappo: Não existe uma regra geral. Por quê? Porque as consequências sobre o indivíduo dependem da dose de radiação que ele vai receber, o que, por sua vez, depende de várias variáveis: é uma fonte muito intensa ou pouco intensa? A que distância a pessoa ficou da fonte? Por quanto tempo? A pessoa mexeu na fonte? Se sim, de que jeito? A pessoa foi contaminada? Enfim, são perguntas essenciais para estimar os efeitos esperados no indivíduo. Mas, para dar uma ideia, se a fonte for relativamente mais perigosa e a dose for um pouco mais alta, podem acontecer queimaduras na pele, descamação, enegrecimento da pele, queda de cabelo, além de sintomas gastrointestinais e hematológicos. Aumenta-se também o risco de desenvolvimento de câncer. Doses muito altas podem ser fatais mesmo quando o indivíduo recebe tratamento médico.

INFORME FLORIPA: Quais são as principais aplicações dos materiais radioativos?
Marcelo Schappo: As aplicações mais comuns são na área de medicina nuclear, em procedimentos de exames e tratamentos que envolvem radiações, aplicações na indústria, como a técnica de gamagrafia, muito usada em metalurgia, por exemplo. Indústrias de papel, de embalagens e de bebidas também podem ter medidores na linha de produção que usam materiais radioativos. E, ainda, temos as aplicações científicas e tecnológicas, em laboratórios de Física, de Química e de Radiologia, por exemplo.

INFORME FLORIPA: E por que às vezes pessoas “comuns” acabam encontrando materiais radioativos?
Marcelo Schappo: Muitos objetos contendo fontes radioativas podem ser, eventualmente, retirados do controle profissional nos contexto para o qual ele foi destinado, como quando são roubados, perdidos durante transportes, descartados acidentalmente etc. Quando isso acontece, dizemos que a fonte se tornou “órfã”, e ela pode acabar indo parar ao alcance do público em muitos lugares inusitados, como centros de reciclagem, manuseio e comércio de sucatas, lixão, terrenos baldios etc.

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