Fóssil encontrado no Brasil pode ser o elo evolutivo entre as aves primitivas e as modernas

Fóssil do pássaro encontrado no interior paulista estava completo e bem conservado (Foto: Divulgação)

Há cerca de 80 milhões de anos, vivia na região onde hoje está localizado o município de Presidente Prudente (SP) um pássaro que pode ser considerado o elo evolutivo entre as aves primitivas e as modernas. Chamada de Navaornis hestiae, teve sua descrição anunciada nesta quarta-feira, 13 de novembro, em um artigo científico que mereceu a capa da revista Nature. Trata-se de um fóssil de ave completo e muito bem preservado, do período Cretáceo Superior do Brasil, e foi encontrado em rochas com idades que variam entre 83,6 e 72,1 milhões de anos conhecidas como Formação Adamantina, no interior do estado de São Paulo. Navaornis tinha o tamanho aproximado de um pardal.

O nome Navaornis é uma homenagem ao paleontólogo brasileiro William Roberto Nava, diretor do Museu de Paleontologia de Marília, que descobriu os fósseis há cerca de três anos, na Bacia Bauru. Já hestiae é uma referência à Héstia, deusa grega da arquitetura, filha de Cronos, o deus do tempo. A intenção é refletir a dualidade do tempo, através do crânio do pássaro, que pertence a uma linhagem arcaica, apesar de sua geometria craniana ser essencialmente semelhante ao das aves como as que vemos atualmente.

Publicado na Nature, o artigo ‘Cretaceous bird from Brazil informs the evolution of the avian skull and brain’ foi assinado por pesquisadores de instituições da Argentina, Brasil, Estados Unidos, Portugal e Reino Unido. O autor principal é o paleontólogo argentino Luis Maria Chiappe, do Museu de História Natural de Los Angeles. Entre os coautores estão os professores brasileiros Ismar de Souza Carvalho, do Instituto de Geociências e diretor da Casa da Ciência da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Rodrigo Miloni Santucci, da Universidade de Brasília (UnB).

Estudos mostraram a relação evolutiva entre os cérebros das aves modernas e primitivas (Ilustração: Júlia d’Oliveira)

No artigo, os pesquisadores fazem uma minuciosa descrição do fóssil, cuja descoberta pode ser considerada uma das mais espetaculares já feitas na Paleontologia de Vertebrados do Brasil. “O fóssil, além de ter o aspecto tridimensional, possui indícios de como era o cérebro desta ave da era dos dinossauros. Seu crânio e cérebro demonstram aspectos morfológicos que são indicativos das transformações evolutivas entre as aves mais primitivas, como por exemplo Archaeopteryx, e as aves atuais”, detalha Ismar Carvalho, que recebe apoio da FAPERJ para a realização de suas pesquisas por meio de um dos mais importantes programas de fomento à pesquisa da Fundação, intitulado Cientista do Nosso Estado.

Após a descoberta, os cientistas fizeram análises morfológicas e estudos tomográficos, que possibilitaram entender aspectos inéditos da anatomia das aves fósseis. Foi realizada a reconstrução tomográfica tridimensional do cérebro e do interior craniano, o que permitiu o entendimento das relações evolutivas desta nova espécie com outras espécies fósseis e atuais. “Os aspectos únicos encontrados nestas etapas de trabalho possibilitaram que se reconhecesse que era uma espécie ainda desconhecida da ciência”, afirma Carvalho.

Ismar Carvalho: pesquisador do Instituto de Geociências e diretor da Casa da Ciência da UFRJ (Foto: Divulgação)

Na UFRJ foram realizadas a análise do contexto geológico, a avaliação da idade e comparações com outras formas fósseis. “A FAPERJ colaborou por meio do pagamento de parte das análises tomográficas necessárias ao estudo, através de minha bolsa de Cientista do Nosso Estado”, explica.

De acordo com o pesquisador da UFRJ, o crânio de Navaornis não possui dentes, tem grandes olhos e é muito parecido com o das aves modernas. O pássaro pertence a um grupo já extinto, o das Enantiornithes, que foi muito comum durante o período Mesozoico, a era dos dinossauros. A sua boa conservação permite entender como e quando ocorreram os processos evolutivos, e até mesmo aspectos da neuroanatomia, que conduziu à origem das aves modernas.

“A descoberta de Navaornis é um marco para a Paleontologia Brasileira. Além da excepcionalidade de sua preservação, demonstra a relevância das aves que existiram logo após a separação dos continentes que formavam Gondwana e que possibilitam o entendimento das transformações evolutivas, até agora desconhecidas, entre as aves mais primitivas e as que hoje encontramos em variados ambientes”, atesta Carvalho.

Fonte: Faperj

Adicionar aos favoritos o Link permanente.